Mauro Santayana
Se não falham os estudiosos, a expressão “o fim da
picada”, deriva da situação em que se encontra, de repente, o sujeito que vinha
seguindo uma trilha, no meio da floresta, e, subitamente, se vê perdido, quando
essa trilha, ou “picada”, aberta à medida que se corta, ou se “pica” o mato à
frente, termina abruptamente, obrigando o viajante a seguir às cegas, ou a
voltar para um distante, e muitas vezes, inalcançável, ponto de partida.
O grampo contra a Presidente da República, com sua
imediata divulgação, para uma empresa de comunicação escolhida para escancarar
seu conteúdo ao país, operado por um juiz de primeira instância, depois da
desnecessária e arbitrária condução coercitiva e do pedido de prisão de um
ex-presidente da República, devido a uma acusação de falsidade ideológica – em
um país em que bandidos com dezenas de milhões de dólares em contas na Suíça,
procurados pela Interpol e condenados à prisão em outros países circulam,
soltos, tranquilamente - representa isso.
O fim da picada de uma Nação em que as instituições se
recusam a funcionar, e estão, virtualmente, sob o sequestro de meia dúzia de
malucos concursados - apoiados corporativamente por toda uma geração de
funcionários de carreira de Estado comprometidos ideologicamente, com a
razoável exceção de organizações como a associação de Juízes para a Democracia
- que atuam como ponta de lança de uma plutocracia estatal, que, embalada por
uma imprensa parcial e irresponsável, pretende tutelar a República,
colocando-se acima dos poderes constituídos.
Perguntado o que achava do pedido de prisão do
Ministério Público de São Paulo, há poucos dias, o líder do PSDB na Câmara
Alta, o senador Cássio Cunha Lima, disse que não via motivos para tanto e
recomendou cautela neste momento. Agradece-se a sua coragem e bom-senso –
Cássio Cunha Lima foi violentamente atacado por isso pela malta radical
fascista nos portais e redes sociais – mas agora é tarde.
A oposição deveria ter pensado nisso quando ainda não
ocupava – tão hipócrita e injustamente quanto outros acusados - as manchetes da
coluna de delações “premiadas”, e abandonou o calendário político normal para
fazer política nos tribunais, por meio da criminalização da atividade,
entregando o país a um grupo de procuradores e a um juiz de primeira instância
que age - como se viu pelo vazamento imediato do grampo do Palácio do Planalto
- como um fio desencapado, não se importando – assim como os procuradores que o
cercam ou nele se inspiram - em incendiar o país para dizer que é ele quem está
no comando, independente da atitude da Presidente da Republica de trocar o
Ministro da Justiça, ou nomear para a Casa Civil um ex-presidente da República,
ou da preocupação de alguns ministros e ministras do STF – pelo menos aqueles
que parecem ter conservado um mínimo de dignidade e de razão neste momento.
Iludem-se aqueles que acham que a Operação Lava-Jato vai
livrar o país da corrupção.
Os resultados políticos da Operação Mani Pulliti – a
operação Mãos Limpas, à qual o Juiz Sérgio Moro se refere a todo instante como
seu farol e fonte de “inspiração”, foram a condução de Berlusconi, um bufão
pseudo fascista ao poder na Itália, por 12 anos eivados de escândalos, seguida
da entrega do submundo do Estado a uma máfia comandada por ex-terroristas de
extrema-direita, responsáveis por mega-escândalos como o da Máfia Capitale, que
envolve desvios e comissões em obras públicas em Roma, da ordem de bilhões de
euros, cujo julgamento começou no último mês de novembro.
Da mesma forma, iludem-se, também, aqueles que acham
que, com a queda do governo, por meio de impeachment, ou de manobra no TSE ou
no TCU, ou de uma Guerra Civil, que se desenha como cada vez mais provável, o
Brasil irá voltar à normalidade. A verdadeira batalha, neste momento e a perder
de vista – e há uma grande proporção de parvos que ainda não entenderam isso –
não é entre o governo e a oposição, mas entre o poder político, alcançado por
meio do voto soberano da população, e a burocracia estatal, principalmente
aquela que tem a possibilidade – pela natureza de seu cargo - de pressionar,
coagir, chantagear, a seu bel-prazer, a Presidência da República, o Congresso e
o grande empresariado.
Em palestra recente, para empresários – quando, com
suas multas e sanções, ele está arrebentando com metade do capitalismo
brasileiro – o Juiz Sérgio Moro afirmou que a operação Lava-Jato não tem
consequências econômicas.
Sua Excelência poderia explicar isso ao BTG, cujas
ações diminuíram pela metade seu valor, quebrando milhares de acionistas, ou
que perdeu quase 20 de reais em ativos desde a prisão de André Esteves.
Ou à Mendes Júnior que teve de demitir metade dos seus
funcionários e está entrando em recuperação judicial esta semana.
Ou, ainda, aos 128.000 trabalhadores terceirizados da
Petrobras que perderam o emprego no ano passado.
Ou às famílias dos 60.000 trabalhadores da Odebrecht,
que também foram demitidos, ou aos funcionários restantes que aguardam o efeito
da multa de 7 bilhões de reais – mais de 15 vezes o lucro do Grupo em 2014 –
que se pretende impor “civilmente” à companhia.
Ou aos funcionários da Odebrecht que estão envolvidos
com projetos de extrema importância para a defesa nacional, como a construção
de nossos submarinos convencionais e atômicos e nosso míssil ar-ar A-Darter,
concebido para armar nosso futuros caças Gripen NG-BR, que terão de ser
interrompidos caso essa multa venha a ser cobrada.
Ou, ainda, aos “analistas” entre os quais é consenso
que a Operação Lava Jato foi responsável por 2%, ou mais de 50%, da queda do
PIB - de 3,8% - no ultimo ano.
Na mesma ocasião, o Sr. Sérgio Moro - como se fôssemos
ingênuos de acreditar que juízes não têm suas próprias opiniões, ideologia e
idiossincrasias políticas – afirmou não ter “partido”.
Ora, ele tem, sim, o seu partido.
E ele se chama PSM, o Partido do Sérgio Moro.
Um “partido” em que não cabem os interesses do país,
nem os do governo, nem os da oposição, a não ser que eles se coloquem sob a sua
tutela.
Assim como não dá para acreditar, com sua
relativamente longa experiência, depois dos episódios de Maringá e do
Banestado, que ele esteja agindo como age por ter sido picado pelo messianismo
que distrai e embala a alma de outros “salvadores da pátria” da Operação
Lava-Jato.
O que - seguindo a lógica do raciocínio - só pode nos
levar a pensar que ele está fazendo o que faz porque talvez pretenda meter-se a
comandar o país diretamente – achando, quem sabe, que as Forças Armadas vão
permitir que venha a adentrar o Palácio do Planalto carregado por manifestantes
convocados pelo Whats UP, em uma alegre noite de buzinaço, como um moderno
Salazar ou Mussolini – ou quando eventualmente se cansar, lá pela
milésima-primeira fase da Operação Lava-Jato - de exercitar seu ego e – até
agora - seu incontestável poder de manter o país em suspense, paralisado
política e economicamente, independentemente do ocupante de turno – quem
grampeia um presidente grampeia qualquer presidente - que estiver sentado na
principal poltrona do Palácio do Planalto.
A alternativa a essa República da “Destrói a Jato”, de
um país mergulhado permanentemente na chantagem, na manipulação, no caos e na
paralisia, é alguém ter coragem, nos órgãos de controle e fiscalização, de
enfrentar o falso “clamor”, pretensamente “popular”, de um senso comum ditado
pela ignorância e a mediocridade, e pendurar o guizo no pescoço do gato – ou
desse tigre (de papel) - impondo ao mito construído em torno dessa operação, e
aos seus “filhotes”, o império da Lei e o respeito ao Estado de Direito e à
Constituição Federal.
Mas para isso falta peito e consciência de História a
quem pode fazê-lo.